Exemplos de
solidariedade em um momento de tragédia. Essa é a síntese do que aconteceu em
Uruguaiana na noite de segunda-feira (6).
Duas famílias abaladas pela dor da perda, sensibilizadas pela necessidade
de doação de órgãos e atendendo pedidos das vítimas em vida, decidiram abreviar
o sofrimento dos componentes da rede de lista de espera por órgãos.
Num dos
casos, em Alegrete, um motorista de 52 anos, durante o trabalho, caiu do alto
do teto de uma residência. Na queda, bateu forte a cabeça. Mesmo resgatado com
vida, era uma lesão muito grave. Deslocado para o setor de alta complexidade em
Neurologia do Hospital da Santa Casa de Caridade de Uruguaiana, foi constatada
a morte cerebral ainda na noite do acidente. Segundo a filha da vítima, o
motorista, que nas horas vagas trabalhava na construção civil, era uma pessoa
que se cuidava muito, sem vícios ou exageros. “Até mesmo na alimentação ele era
regrado”, lembra. Por isso, sempre deixava claro que se algo ocorresse,
desejava que seus órgãos fossem doados.
Em Santiago,
no mesmo dia, uma mulher de 50 anos, que não apresentava qualquer sinal de
problema físico, sofre um Acidente Vascular Cerebral (AVC) grave. Deslocada
para Uruguaiana, o setor de Neurologia do HSCC constata sua morte cerebral. Consternada
com o fato, a família também demostra vontade de auxiliar alguém que esteja na
lista de espera por transplantes.
O Rio Grande
do Sul, que já foi o número um em transplantes no país, respeitada a proporção
em relação à população, está agora em terceiro lugar nessa delicada modalidade
de cirurgia, atrás de São Paulo e do Paraná. O número de doações de órgãos
concretizadas vem caindo ano a ano no Estado. Por isso, o cirurgião Juliano
Martini, que coordenou as equipes em Uruguaiana, esclarece a importância do
gesto das famílias de Alegrete e Santiago, na doação de órgãos. Duas equipes da
Central de Transplantes de Órgãos do Estado estiveram na Santa Casa para a
captação. Uma responsável pela retirada de rim e fígado e outra pela retirada
do pulmão.
Tanto rim,
como fígado foi implantado nos receptores ainda nesta terça-feira. Já o pulmão
retirado ainda deveria passar por bateria de exames até chegar ao receptor.
A equipe de
enfermagem do HSCC auxiliou os cirurgiões na realização da retirada dos órgãos.
No hospital, a equipe ten a coordenação do médico Luiz Fernando Cibin e contou
com a participação das enfermeiras Jossana Aguilar, Adriana Prause, Andrise
Porto Alegre e Glaucia Fenner e da secretária Giliane Suarez. Cibin salienta
que o fato de haverem dois doadores simultâneos em Uruguaiana aptos para
doação, como ocorreu nessa situação, não é comum. Por isso, a importância do
que aconteceu.
O
procedimento para a retirada dos órgãos durou aproximadamente três horas. Os
nomes dos pacientes e de seus parentes foram omitidos nesta reportagem a pedido
das famílias.
Um estudo da Associação Brasileira de Transplante de
Órgãos, integrada pelas centrais de doações espalhadas pelo Brasil afora,
aponta que mais da metade das doações no Rio Grande do Sul (60%) não se
concretizou porque os familiares do doador em potencial não autorizaram a
cirurgia. Os 40% restantes de doações não efetuadas ocorreram porque havia
contraindicação médica. Das notificações de morte encefálica em
comparação com doadores efetivos no Rio Grande do Sul, há ainda uma disparidade
muito grande. No ano passado, ocorreram 579 mortes encefálicas, contra apenas
201 doações.
O Brasil é
responsável pelo maior sistema público de transplante do mundo e os cuidados se
estendem até os medicamentos pós cirúrgicos. Existem hoje no País 27 centrais
de notificação, captação e distribuição de órgãos; 11 câmaras técnicas
nacionais; 748 serviços distribuídos em 467 centros; 1047 equipes de transplantes;
e 71 organizações de procura por órgãos.
Em 2013, não ocorreram, segundo a Central de
Transplantes, procedimentos no Hospital da Santa Casa de Caridade de
Uruguaiana.